Bleed – A ‘‘transferência’’ psicológica em jogos.

Provavelmente você já jogou algum jogo, e pareceu que sentiu o que seu personagem estava vivenciando, talvez você  teve que pausar o controle por um momento, enquanto lidava com uma complexa decisão moral ou você gritou de alegria quando conseguiu derrotar seu personagem ‘‘nemesis’’ de longa data. Pois bem, hoje vamos falar sobre os altos e baixos de você como um jogador, andando ao longo de sua montanha-russa emocional, enquanto ‘‘sente as dores’’ de seus personagens.

Quando interpretamos um personagem em um jogo, damos voz a uma pessoa diferente, que toma atitudes que na vida real, geralmente não tomaríamos ou não vivenciamos em nossas vidas diárias, ou dizemos a nós mesmos que podemos definir o personagem de volta e ir embora sem consequências, porque afinal é apenas um jogo, mas isso não é bem verdade.

Ocasionalmente sentimos o que nossos avatares fictícios experienciam como emoções reais, esse cenário fictício se infiltra em nossas mentes no mundo real. Sem prestar muita atenção, nós prendemos a respiração durante uma luta tensa, nos inclinamos para a esquerda ou para a direita em uma curva apertada em Mario Kart ou xingamos quando um companheiro que lutava ao nosso lado de repente morre. Este fenômeno é chamado transferência psicológica dos jogos ou ‘‘Bleed’’. Ela mostra como as emoções do personagem fictício estão presentes nas emoções reais dos jogadores, o bleed não é inerentemente bom ou ruim. Tudo vai depender de como vai ser aplicada e desenvolvida, como na vida real por exemplo, algumas experiências nos deixam sentindo horríveis sobre nós mesmos, enquanto outras, nos deixam sentindo no topo do mundo.

 Alguns jogadores experimentam o bleed mais facilmente do que outros, como por exemplo: Carls, se vê refletindo sobre o destino de um personagem depois que ele terminou um jogo, enquanto Farls pode definir com mais facilidade o destino dos personagens na mesma hora em que joga. Provavelmente Carls é mais suscetível ao bleed do que o Farls.

Vamos notar uma outra situação, talvez você tenha tido um dia ruim no trabalho e você está se sentindo irritado naquele momento, pode ser mais difícil jogar como um personagem que precisa fazer as pazes com os moradores das proximidades. Talvez para essa pessoa, seja melhor um jogo em que tudo o que ela deve fazer é sacar uma espada ou seguir conversando com alguns NPCs. Tudo isso acontece de forma não consciente, para que nossas emoções possam ser transferidas (bleed) para fora do personagem, bem como transferir (bleed) em nós como o jogador.

Embora nem todas as reações emocionais contam como bleed, é importante saber que esse fenômeno que acontecem nos jogos, é um tipo específico de reação emocional de empatia, onde a barreira entre quem está jogando e quem você está ‘‘controlando’’ (personagem) se quebra.

Existem vários games que utilizam o bleed, dois em particular que eu gosto mundo e os exemplos ficam mais claros é Life Is Strange e Detroit: Become Human. O que eles tem em comum é o bleed e isso é parte do sucesso deles. O bleed nesses dois jogos, corresponde a capacidade de imersão e discussão sobre lutas sociais, saúde mental, autoconhecimento, entre outras coisas.

Você gostaria de usar bleed em seus jogos? Existem algumas maneiras diferentes de aumentar a possibilidade de empatia em sua narrativa. Primeiro você precisa duplicar ou emular as ações diretas do personagem. Jogos com papéis bem definidos com história, são excelentes exemplos disso. Ações simples, como verificar documentos, cenários, como parte daqueles personagens. Essas ações precisam ser projetadas para incentivar o bleed nos jogadores. Pense nas emoções que os jogadores precisam experenciar para tomar decisões ou decidir ações exatamente como o próprio personagem. Quanto mais abstrações você remover de uma situação, mais seu jogador vai simpatizar com isso.

Outro exemplo que temos, é em Pokemon Go, eles promovem o bleed a partir da comunicação como o personagem, como um jogo de role-playing de mesa que também faz isso, porque, como jogador, você estáa dizendo e narrando as ações em nome do seu personagem.

Dramas de áudio interativos ou jogos como Ace Attorney, onde você pode conversar com o jogo e obter feedback, aumenta nossa conexão emocional e até escolhas de diálogo na primeira pessoa podem ajudar com isso. Esses diálogos ajudam a explorar nossas conexões emocionais com o outro.

É por isso que jogos de tabuleiro acabam criando fortes reações emocionais em quase todos os jogos. Pois ele é conduzido como uma série de conversas e situações inusitadas, como por exemplo, alguém que você pensou que estava do seu lado vai te trair e às vezes isso vai realmente doer, isso é porque não há um lançamento ruim de dados ou um AI de computador entre você e essa traição.

Por fim, você pode aumentar o bleed apresentando situações que são reconhecidas como ações humanas.  O Jogo deve ter uma camada realista, quando um personagem passa por experiências que parecem familiares para nós, isso se torna uma ferramenta poderosa. Funciona como um gatilho emocional, age como um atalho que traz todas as nossas próprias memórias de quando nos sentimos da mesma forma, acabamos vendo parte de nossa própria história e, ao fazer isso, simpatizamos com os personagens cuja as narrativas, pelo menos em um nível emocional, ecoa em parte o que somos. Por isso, é muito importante que as narrativas que geram emoções negativas, exibam alertas, porque às vezes emoções negativas também podem gerar bleed, e te digo que com mais intensidade dependendo de cada pessoa.

Os jogos podem ser ótimas ferramentas compreender nossas próprias reações emocionais ou mesmo apenas no menor grau, nos ajudar a entender como é ser alguém que enfrenta lutas que são diferentes da nossa. Talvez essa seja uma das as ferramentas mais valiosas, por isso, use-a com moderação, se precisa peça ajudar de um profissional e não tenha medo de deixar seus jogos com bleed.

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